Prezado leitor, você já ouviu falar sobre a prática de fraude na jornada de trabalho do gerente?
Essa é uma realidade cada vez mais presente no mundo corporativo e que pode afetar diretamente a vida profissional e financeira de muitos trabalhadores.
A tese que trago para você é que muitos empregadores colocam empregados no cargo de gerência com o objetivo de evitar o pagamento de horas extras.
Você sabia que muitas empresas fazem o registro de alguns dos seus funcionários no cargo gerência apenas para aumentar a sua jornada de trabalho?
Isso mesmo, colocar funcionários no cargo de gerência acaba retirando a obrigatoriedade de controle de jornada.
A ausência de controle de jornada permite que o empregador faça seus funcionários trabalharem mais tempo, sem que seja necessário o pagamento de horas extras.
Neste texto, vamos explorar os motivos que levam a essa prática, suas disposições legais e como os trabalhadores podem se proteger e garantir seus direitos.
Então, continue lendo e descubra tudo o que você precisa saber sobre a jornada de trabalho do gerente e o pagamento de horas extras.
Como funciona o cargo de gerente?
O cargo de gerente é regulado pela Consolidação das Leis do Trabalho (CLT) e pode ser caracterizado como um cargo de confiança.
Geralmente, o gerente possui uma série de atribuições, sendo a mais importante a responsabilidade pela gestão de uma equipe e pelo atingimento de metas.
De acordo com a CLT, para ser considerado um ocupante de cargo de confiança, é preciso que o funcionário tenha poderes de gestão.
Ou seja, é preciso que ele possua autonomia na tomada de decisões importantes para o funcionamento da empresa.
Além disso, o funcionário deve ter subordinados diretos, e suas atividades devem ser relacionar-se à gestão de pessoas e de processos.
Logo, para ser um ocupante de cargo de confiança, é preciso que ele tenha autonomia e liberdade para tomar decisões importantes, sem a necessidade de autorização prévia do superior hierárquico.
Diferença entre cargo e atividade desempenhada
De início, para entrarmos no assunto, você precisa entender a diferença entre cargo e atividade desempenhada pelo trabalhador.
O cargo é a posição hierárquica do empregado na estrutura da empresa.
Normalmente, é o que consta registrado na Carteira de Trabalho do funcionário.
Ele se refere à posição que o trabalhador ocupa dentro da empresa.
Por exemplo, o cargo de gerente, o cargo de vendedor, o cargo de assistente administrativo, etc.
O empregador tem a obrigação de registrar a função/cargo que o trabalhador ocupa em sua carteira de trabalho.
É com base nessa informação que determinam-se os direitos e deveres trabalhistas.
Por outro lado, a atividade desempenhada pelo trabalhador refere-se às tarefas efetivamente executadas por ele no desempenho de suas funções.
Tenha em mente que, se um funcionário é registrado como gerente, é de suma importância que suas atividades sejam compatíveis com o seu cargo.
Isso acorre porque, em tese, as atividades desempenhadas devem ser compatíveis com o cargo ocupado pelo funcionário.
Qual é a jornada de trabalho do gerente?
Entende-se por gerente os chefes e diretores de algum departamento ou filial de uma empresa.
Via de regra, a jornada de trabalho do gerente é livre de controle, ou seja, a empresa não realiza o controle de ponto como acontece com o trabalhador comum.
Em razão disso, o gerente não possui o limite de jornada de trabalho de 8 (oito) horas de serviço por dia.
Em contrapartida, deve receber uma gratificação de função que, obrigatoriamente, deve ser igual ou superior ao salário básico com acréscimo de 40%.
O gerente tem direito a horas extras?
Em suma, como a jornada de trabalho do gerente não tem controle, ele não tem direito a receber o adicional de horas extras.
O gerente não deve receber o adicional de horas extras nem mesmo quando a jornada de trabalho for superior a 8 horas diárias.
Isso ocorre porque a lei trabalhista já determina que o gerente receba uma gratificação de função igual ou superior a 40% do salário básico.
Assim, a ideia é que esse valor destina-se a compensar a jornadas de trabalho além da jornada padrão, motivo pelo qual o gerente não deve receber horas extras.
Contudo, você sabia que há casos em que o gerente poderá receber o pagamento de horas extras?
Isso acontece quando o gerente consegue, mediante ação judicial, a descaracterização do cargo de Gerente em razão de fraude trabalhista.
Você quer saber quando ocorre fraude na jornada de trabalho do gerente?
Então confira as informações a seguir.
Como ocorre fraude na Jornada de Trabalho do Gerente?
A fraude na Jornada de Trabalho do Gerente ocorre justamente quando há uma incompatibilidade entre o cargo de confiança ocupado e as atividades desempenhadas.
Em linhas gerais, ela ocorre quando a empresa registra o funcionário no cargo de gerente apenas para fazer ele trabalhar além das 8 horas diárias e não pagar horas extras.
Isso porque, como você aprendeu, o gerente não recebe horas extras extras, ante a ausência de controle de jornada e pelo fato dele já receber uma gratificação não inferior a 40% de seu salário efetivo.
Contudo, quando o gerente não desempenhar as atividades compatíveis com seu cargo, isso pode configurar fraude trabalhista, uma vez que o gerente deve desempenhar atividades de gestão.
Quando isso ocorrer, o gerente poderá pedir judicialmente a descaracterização do cargo de Gerente e cobrar o pagamento de todas as horas extras trabalhadas além da 8ª hora diária.
Você sabe como detectar fraude na jornada de trabalho de quem ocupa cago de gerência?
A seguir irei lhe explicar como detectar eventual fraude na jornada de trabalho e como descaracterizar o cargo de gerente.
Como funciona a descaracterização da jornada de trabalho do Gerente em razão de fraude trabalhista?
A descaracterização do cargo de confiança pode ocorrer quando as funções de fato exercidas pelo trabalhador não se enquadram em uma atividade de direção, chefia ou de confiança.
Essa descaracterização pode gerar o pagamento de horas extras, pois, nesses casos, o gerente passa a ser um trabalhador comum.
Mas afinal, quais fatos podem contribuir para que o cargo de gerente seja descaracterizado?
A seguir, você verá quais fatos contribuem para demostrar que o ocupante do cargo de gerência não exercia as atividades compatíveis com seu cargo.
Falta de autonomia
Basicamente, à descaracterização do cargo de confiança está calcada na falta de autonomia na tomada de decisões.
Se o funcionário não tem poder para tomar decisões de forma autônoma e não tem subordinados, é possível que não seja considerado um ocupante de cargo de confiança.
É comum que o empregado em cargo de confiança tenha maior liberdade e responsabilidade na tomada de decisões.
Porém, se as decisões que ele tomar precisam ser referenciadas pelo superior hierárquico, ele não estará exercendo uma atividade de confiança.
Excessiva subordinação ao empregador
Se o empregado em cargo de confiança tem horário de entrada e saída fixos, e seu trabalho é fiscalizado de perto pelo empregador, é possível que ele não esteja exercendo um cargo de gerência.
Se o funcionário é submetido a controle constante de sua atividade, seja por meio de controle de horário ou fiscalização, é possível que sua função não seja considerada de gerente.
Nesses casos, pode ser reconhecido que ele ocupa um cargo comum, o que o torna elegível ao recebimento das horas extras quando trabalhar além da jornada de trabalho comum.
Ausência do poder de comando
Outro ponto importante é a ausência de poder de comando.
Se o empregado em cargo de confiança não tem poder de mando sobre outros empregados da empresa, e suas funções se limitam a atividades comuns, ele não poderá ser considerado como ocupante de cargo de confiança.
Atividades rotineiras
Se o funcionário executa atividades rotineiras e técnicas, sem possuir poder de decisão, sua função pode não ser considerada um cargo de gestão.
Salário base inferior a 40% do salário do cargo efetivo
Conforme já mencionado, o gerente deve obrigatoriamente receber um salário base igual ou superior a 40% do valor do seu salário quando exercia um cargo efetivo.
Caso contrário, o trabalhador poderá cobrar os valores que não foram pagos referente a sua gratificação, que não poderia ser inferior a 40% de seu salário efetivo.
Assim como, ele poderá pedir a descaracterização do cargo de gerente, em razão da ausência do pagamento dentro dos parâmetros legais.
De todo modo, a base do raciocínio é o seguinte:
- se o gerente não desempenha as atividades típicas de um cargo de gestão/confiança, não há motivo que justifique ele trabalhar sem controle de jornada e sem receber horas extras.
Qual é a consequência da descaracterização do cargo de Gerente na sua jornada de trabalho?
Anteriormente, você aprendeu quais são os fatos que poderem descaracterizar o cargo de confiança, tornando o gerente um trabalhador comum.
Agora, você pode se perguntar: qual seria a consequência prática da descaracterização do cargo de Gerente?
Como isso poderá beneficiar o trabalhador?
Na prática, as consequências são as seguintes:
1ª O trabalhador perde a qualidade de ocupante do cargo de gerência, e passa a ser considerado um trabalhador comum.
2ª Ao funcionário aplicam-se a regras da jornada de trabalho padrão, ou seja, ele deve ter o registro da sua jornada, e deve receber o pagamento das horas extras trabalhadas além da jornada padrão.
Em razão disso, diversos funcionários que ocuparam cargo de gerência em determinada empresa, estão buscando a Justiça do Trabalho para conseguir os seguintes benefícios:
- descaracterização do cargo de Gerente;
- e o pagamento do adicional de horas extras.
Pode parecer difícil, mas para você precisa entender da melhor forma possível o meu raciocínio.
Pensando nisso, eu vou explicar como é a lógica do pagamento das horas extras nesse caso.
Como funciona o pagamento de horas extras pela descaracterização do cargo de Gerente?
Caso a tese de descaracterização do cargo de gerente seja acolhida pela Justiça do Trabalho, o gerente poderá ter direito ao pagamento de horas extras.
Nessa hipóteses, o pagamento dessas horas extras corresponderá a todas as vezes que o gerente trabalhou além da 8ª hora diária.
Isso ocorre porque, ao ser enquadrado como cargo de confiança, o gerente fica dispensado do controle de jornada, não tendo direito ao pagamento de horas extras.
Isso mesmo quando ele trabalhar além da carga horária prevista.
Porém, se o cargo de gerente for descaracterizado, o gerente passa a ter direito ao controle de jornada e ao pagamento de horas extras.
Assim, sempre que sua jornada ultrapassou a carga horária prevista na legislação trabalhista durante o contrato de trabalho, você deveria receber horas extras.
É importante destacar que, para ter direito ao pagamento de horas extras, o gerente deverá comprovar o efetivo trabalho em horas extras, seja por meio de registro de ponto, contracheque ou testemunhas.
Assim, caso seja possível descaracterizar o cargo de gerente, o trabalhador poderá obter o pagamento das horas extras trabalhadas, representando uma diferença significativa em seu salário.
Conclusão
Assim, a descaracterização do cargo de gerente pode ser uma alternativa para quem ocupa esse cargo e realiza atividades que não se enquadram nas de cargo de confiança.
Dessa forma, é possível obter o direito ao controle de jornada e ao pagamento de horas extras, caso seja comprovado o trabalho além da carga horária prevista ao trabalhador comum.
Além disso, é importante destacar que o pagamento de horas extras pode representar uma significativa diferença no salário dos gerentes, podendo ser uma oportunidade para garantir um aumento na renda.
Portanto, se você é gerente e acredita que está realizando atividades que não se enquadram na definição legal de cargo de confiança, é importante reparar essa injustiça.
Por isso, busque orientação jurídica para avaliar a possibilidade de ingressar com uma ação trabalhista de descaracterização do cargo de gerente e obtenção do pagamento de horas extras.
Não deixe de lutar pelos seus direitos e pela justiça no ambiente de trabalho.
Um abraço e até a próxima!
ALFREDO ANTUNES NEGREIROS
OAB/CE 43.475